quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Sopro vital

Todas as perguntas são legítimas. O que é feito da bagagem que trazia de Luanda? Ficou retida na Portela por exceder o peso que a minha vida em Lisboa é capaz de aguentar? Extraviou-se algures, por entre milhas de mistérios atlânticos?

Retida ou perdida, estranho não a ter dado por sofrida. Hoje, quase meio ano depois da aterragem, dou-a ‘simplesmente’ por vivida. Vivida desde o primeiro reencontro via sms, depressa alargado a dezenas delas. Prosseguida mais tarde num, noutro e mais um e mais outro exame ocular, explorado entre suspiros, silêncios, batimentos acelerados e lembranças de partilhas recentes. Em cada momento, o mesmo magnetismo de sempre e no entanto a mesma impossibilidade de antes - A OUTRA - agravada por uma outra impossibilidade - A DISTÂNCIA.

Primeiro a outra. Está presente desde o início, tenho dúvidas sobre se continua a estar, mas, tenha ela ido ou ficado, eu avançar ou recuar nunca poderia depender disso por mais que não pudesse deixar de ser influenciada por isso. Afinal, cada um tem de valer por si, independentemente de princípios, meios e fins.

Agora a distância. Está adiada para já, mas esteve iminente desde a chegada. Se estava no ir não fazia sentido começar a construir. Se estava no ir não fazia sentido insistir. Se estava no ir nada de nada fazia sentido. Mas, um dia após o outro, acabei ficando até achar-me assim. Simultaneamente ligada e desligada da bagagem. Ligada por experiências e afectos inigualáveis, desligada por sentir uma ultrapassagem do tempo.

Sem brusquidão, com muita serenidade. Como quem sente um sopro de vida.

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