segunda-feira, 30 de junho de 2008

Sabor a Brasil

Kevin Kuranyi de um lado, Marcos Senna do outro. Por muitas fintas que o
jogo desse, o Brasil acabaria sempre no topo da Europa. Terminou com o segundo
Senna da minha vida elevado ao pódio dos grandes campeões.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Eclipse solar


São os cochichos nos corredores. É o 'diz que disse' junto da máquina do café. As caras fechadas. Os silêncios precipitados pela aproximação de passos não anunciados. Amarram-se-me nós no estômago. Esforço-me por desatá-los com trabalho, mas hoje a escrita não me agarra. Não me sinto insegura, pelo contrário. Também não me sinto pressionada, pelo contrário. Nem sequer me vejo desvalorizada, pelo contrário. Mas o nó teima em embrulhar-me o estômago. Procuro respostas, descubro mais dúvidas. Exercito optimismos por oposição a pessimismos. Faço-o há anos, e há anos me encontro na iminência de accionar o meu plano B. Se a coisa correr mal, esvazio as minhas magras poupanças, pego no meu portátil, preparo um kit de sobrevivência e corro para o avião. Aconteça o que acontecer, resistirei fiel a mim própria: por mais fundo que seja o túnel, nunca deixarei de acender uma luz de saída.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Cemitério de letras






Os erros de português irritam-me. Sobretudo por se multiplicarem em Portugal e por serem transmitidos pelos próprios portugueses. Ainda vou dando uns descontos à oralidade (inclusive a mim própria), mas custa-me aceitar que a escrita circule com tantos abatimentos ortográficos. Gigas deles nos meus emails: o ‘HÁ’ amputado do H, os cedilhados a obstruírem as sílabas CE e CI, os E’s carregados de I´s, os X’s substituídos por S’s.



Todos erros de português de gente que, se não nasceu, cresceu e vive em Portugal. Gente escolarizada que se assume familiarizada com as novas tecnologias, mas que desconhece a existência de um corrector ortográfico. Talvez por ignorar sequer a noção de ortografia.
Não me espanta. Afinal, no 12.º ano cheguei a ter uma colega (entretanto mais uma licenciada) que confundia o verbo crescer com o substantivo creche!!! Não me espanta, mas irrita-me. Sobretudo porque os sucessivos e abundantes erros da minha ex-colega nem sequer lhe valiam o chumbo a língua portuguesa. E isto numa altura em que os testes de português ainda eram testes. O que esperar agora?



Enquanto se prolongam as discussões sobre os facilitismos dos exames de Português e de Matemática do 12.º ano, só me vem à cabeça a última prova de aferição de Língua Portuguesa do 6.º ano.
Para quem não ainda não leu, segue-se o anúncio que serviu de arranque àquele exame: «Venho cachorro épagneul-breton puro, nascido a 07MAR07, branco e castanho. Linha francesa. Excelente para caça ou companhia. Entregue com vacinas e desparatisações actualizadas. Contactar Canil Municipal de Évora».



Perguntaram os avaliadores: «Qual a intenção de quem colocou o anúncio?». Não fosse a questão baralhar miúdos que têm pelo menos 11 anos, o enunciado ofereceu as seguintes hipóteses:
Apresentar-se como criador de raça;
Conseguir comprador para um cachorro;
Elogiar as qualidades do cachorro;
Divulgar o trabalho do Canil Municipal de Évora.

Palavras para quê? Façam-se cruzes e mande-se o português para a cova!

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Eu e o Pepe




Portugal eliminado. Intervalo nas discussões. Fim das insistentes convocatórias para encontros de 90 minutos de ‘euroforia’. Sem Brasil por força da geografia, e sem Rio Ferdinand, por força de uma eliminação esteticamente condenável, sobrou-me…o Pepe.


Brazuca enraizado até aos 17 anos, ‘encontrou-se’ em Portugal através do futebol. Entre fintas, chutou para canto os piores prognósticos de sonhos perdidos de sol a sol, e descobriu o caminho milionário de uma das melhores ligas europeias. Agora canta vitória, enquanto agita a bandeira lusitana, ignora o estandarte canarinho, e suscita uma reedição do famoso brado heróico e retumbante, celebrizado nas margens plácidas do Ipiranga. Desta vez, sem «o sol da liberdade em raios fúlgidos», o que brilha «no céu da pátria nesse instante» é o reflexo de seculares vaidades nacionalistas.


Pepe é ingrato e Pepe é traidor. Simplesmente porque Pepe exibe orgulhoso a sua portugalidade adquirida e afasta qualquer ligação ao escrete, afirmando-se indiferente à busca brasileira por um lugar no Mundial de 2010.


Verdade? Conveniência?
Naturalidade é terra, nacionalidade é solo, pátria é afecto. Mas não falta quem insista em exigir uma justificação racional de um intransmissível «sense of belonging together».

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Elas não sabem o que querem!


Ignorei a chegada do email. Trazia «monólogo de uma mulher moderna» no assunto, e exibia a classificação «fantástico». Apesar de ser uma mulher moderna e de gostar de coisas fantásticas (que as há, há), reconheci no email um dos pecados capitais dos forwards e recusei penitenciar-me num scroll-down. Só mudei de ideias algumas horas mais tarde, já em casa, quando a classificação fantástico apareceu reforçada com o comentário: «É a mais pura das verdades».
Se era verdade - por muito que a verdade muitas vezes se resuma a um mero confronto de perspectivas -, eu tinha de conhecê-la. Pior para mim: acabei preocupada com as 'verdades' de duas amigas.


«Quero ficar em casa, a cozinhar, a ouvir música, a cantar, etc???»


«Gostava de saber quem foi a bruxa imbecil, a matriz das feministas que teve a desgraçada da ideia de reivindicar os direitos da mulher, e por que o fez connosco que nascemos depois dela???»


«Estava tudo tão bem no tempo das nossas avós???»


AAARRRGGHHH! Quanto mais lia, menos percebia a cabeça por trás do monólogo, menos entendia as cabeças por trás da divulgação do monólogo.

«Tínhamos o domínio completo dos nossos homens, eles dependiam de nós para comer, para se vestirem e para parecerem bem à frente dos amigos. E agora? Onde é que eles estão???»

Tanto pergunta a monologante, que só mesmo a monologante para responder: os homens «fogem de nós (mulheres modernas) como o diabo da cruz (...), lançando-nos no calabouço da solteirice crónica aguda!!!!» Isto quando «antigamente os casamentos eram para sempre». E como uma desgraça nunca vem só: «a maior prova da superioridade feminina era o facto de os homens esfalfarem-se a trabalhar para sustentar a nossa vida boa!»

Sei que é frase feita, desfeita e refeita, mas depois de ler tanta frustração junta, só me ocorre escrever que algumas mulheres não sabem mesmo o que querem. E como diria o grande Jean-Paul Sartre: «Liberdade não é fazer o que se quer, mas querer o que se faz».

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Amor à terceira vista






O primeiro estava velho demais. Não pela idade, que nem sequer me pareceu adiantada, mas sim pelo estado de má conservação. Falta de cuidado, era o que era.

O segundo mostrou-se ambicioso demais. Não pela apresentação, que me pareceu adequada, mas sim pela má localização. Falta de discernimento, foi o que foi.

O terceiro apanhou-me já desconfiada. Não pela origem, avalizada por uma amiga, mas sim pelo fracasso das tentativas anteriores. Perda de entusiasmo, era o que era.

Foi então que, ao fim de uma semana de adiamentos diários, se deu o enguiçado encontro. Perfeita sintonia, foi o que foi.

Sei que ele está muito longe de ser perfeito, mas me pareceu tão harmoniosamente feito à minha medida que não hesitei. Mesmo sem muita luz, senti-me iluminada pela sua presença. Quatro semanas depois do arrebatamento, a ligação oficializou-se com a assinatura do contrato de arrendamento. Que feliz que estou com o meu minúsculo, porém poderoso apartamento: é uma cave, fica algures em Odivelas, mas tem vista para os meus sonhos.

terça-feira, 10 de junho de 2008

The ex-factor






O fenómeno é incontornável. De tal forma, que as duas news magazines mais vendidas do mercado lhe abriram as capas. A Visão fez dele o tema principal da edição; a Sábado dedicou-lhe um assunto secundário, porém com destaque. Ambas reconheceram na série-filme um fenómeno, ainda que cada uma à sua maneira: a Visão vasculhou-lhe a filosofia, a Sábado preferiu demonstrá-la.
Salvaguardadas as devidas preferências (é preciso ter), o resultado despertou-me a leitura para um confronto entre teoria e prática, encerrado pela minha valorização da acção. Como dispenso saber a opinião da ti(p)a de Cascais que diz não haver coincidências, ou da actriz que tem apelido de ‘bairro bem’ de Lisboa, concentro a minha leitura nas adaptações portuguesas de Carrie, Charlotte, Miranda e Samantha. E apesar de reconhecer uma certa ‘forçação de barra’ na atribuição dos papéis, acredito que o sucesso de o Sexo e a Cidade começa e acaba nessa identificação. Na vida como na série, e agora como no filme, existem enredos e emoções tão universais, quanto genuinamente particulares. Concordo com a minha amiga e companheira de sessão cinematográfica, quando me diz que «nenhum homem consegue entender o filme como uma mulher». Mas digo mais: por muito que todas as mulheres consigam interiorizar o filme, no final, dificilmente exteriorizarão a mesma mensagem.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Uma questão de preferência






Nunca liguei muito aos prazos de validade dos produtos, porque sempre exerci os direitos de preferência que me são consagrados nas embalagens. Mesmo quando o rótulo não define nenhuma preferência para o meu consumo, e a embalagem opta apenas por me impor a obrigação de consumir (consumir antes de/até), recuso-me a abdicar de preferir. Por isso continuo a consumir tudo de acordo com a minha preferência: às vezes antes, outras depois de vencida a data indicada na embalagem. Nem por isso perco o paladar. Nem por isso deixa de me saber bem. Porque mais importante do que o tempo das coisas, é o tempo das sensações. E, mesmo fora de prazo, eu prefiro saboreá-las.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Quem te viu e quem te lê




Sempre gostei de observar diferenças. Assinalei-as durante anos nas páginas de passatempos de revistas e jornais, com o mesmo entusiasmo que agora dedico a identificar discrepâncias entre os factos e as notícias. Confesso: um dos meus exercícios preferidos é devorar artigos sobre acontecimentos que presenciei, comparando as versões escritas com as minhas leituras vividas. Vale tudo como matéria de apreciação: pode ser uma conferência de imprensa, um casting para os Morangos com Açúcar, ou a apresentação de uma novidade pseudo-revolucionária. Mas, pela extensa cobertura noticiosa que atrai, nada rende tantos parágrafos de diferenças como o Rock in Rio. Em três edições do auto-intitulado maior festival de música do mundo, fico-me por igual número de observações. Todas recolhidas no primeiro dia de rock do ano.



  1. Amy Winehouse. Depois da polémica dos ses - se sobreviveria, se viajaria, se actuaria - a imprensa virou-se para a a polémica dos des - decadência da cantora, degrado do espectáculo, desrespeito com o público. Não percebo! Será que se esqueceram assim tão rápido dos motivos que alimentaram a lengalenga dos ses? Tão rápido, que nem sequer se lembraram de questionar as opções da organização? Ou estaria o concerto de Amy Winehouse ao serviço secreto de um mundo melhor? Seria assim tão inconcebível esperar o pior de Amy Winehouse? Se para mim era mais do que previsível assistir aos despojos de um talento em ruína, para a organização que prega a responsabilização social, seria expectável que não promovesse tamanha desresponsabilização.


  2. Preço dos bilhetes. Em tempos de crise, pagar 53€ para assistir a um festival de música soa a… notícia. Vai daí, o pessoal da comunicação desatou a multiplicar os lucros: se no primero dia estiveram aproximadamente 90 mil pessoas no Parque da Bela Vista, isso significa que a estreia do festival rendeu cerca de 4,7 milhões de euros aos cofres da organização. Alguém se lembrou de contabilizar os espectadores que entraram de borla? Sabem quantos pseudo-VIP's foram convidados? E o pessoal que desenrascou bilhetes mais baratos à pala de promoções e transacções opacas?


  3. TMN silenciada. Nem sms's. Nada. Entre erros constantes de ligação e sucessivas falhas no envio de mensagens, o pessoal da rede TMN desesperava. Comunicação zero! Enquanto isso, os clientes Vodafone desfrutavam de uma vantajosa presença no lote de patrocinadores do Rock: ao contrário dos não patrocinadores, conseguiam falar e enviar mensagens entre si. Dizem os crédulos, imprensa incluída, que as dificuldades de comunicação (e não impossibilidades) foram o espelho da elevada concentração de telemóveis. Lembram os incrédulos, eu incluída, que os problemas de ligação terminaram no exacto momento em que Lenny Kravitz abandonou o palco. Ou seja: antes sequer de o público ter tido tempo de dispersar e aliviar a alegada sobrecarga de rede. O que vale é que como o silêncio é de ouro, por esta altura o mundo já anda bem melhor.