terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Best of

Faço-o por gosto e, ainda assim, canso-me, indiferente ao peso das mais enraizadas tradições populares. Carta após carta, fui contando assim os primeiros dias da minha estreia em Luanda.

Estava à espera do melhor momento para vos escrever estas linhas, mas desconfio que a oportunidade de teclar novidades no sossego de casa pode nunca chegar. Então, à falta de net ao domicílio – ora o problema está numa avaria de sistema, ora a pessoa responsável foi a um casamento, ora isto, ora aquilo, já lá vão duas semanas de insistências – aproveito a redacção para enviar algumas das minhas primeiras impressões.

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Estou a viver em Alvalade, que, já me tinha constado, é uma zona ‘bem’ da cidade. O que não imaginava é que teria o conforto dos pastéis de nata e dos pãezinhos alentejanos. Abençoados tugas que por cá andam… Mas, apesar da boa referência da zona, confesso que assim que estacionei a visão sobre o prédio que me aloja receei pela minha vidinha. O que vale é que, apesar de o edifício preencher todos os requisitos para ilustrar um postalito de guerra, o apartamento é porreiro.

Excluindo a ausência de net, que me tem barrado as ansiadas ligações de fim-de-semana à família, não me falta nada. Tenho ar condicionado, TV cabo com os canais que me enchem as medidas (Globo, AXN, FOX’s para vários gostos e, mais importante ainda, a Sport TV África com acesso aos jogos do Glorioso), empregada doméstica de segunda a sexta-feira (Uau! Pensei que nunca na vida teria tal coisa) e segurança, embora nunca me tenha sentido ameaçada. Em suma, todos os confortos da minha bela cave de Odivelas e mais alguns.

O cubico (vá, toca a interiorizar o vocabulário palanca), também oferece a particularidade de ter uma casa de banho que, de quando em vez, se abre, à passagem do segurança – contratado especialmente para guardar os moradores (eu incluída) dos dois apartamentos da empresa no building. Felizmente, foi a lavar as mãos que dei conta de que o dito usa a zona da lavandaria (para onde dá a janela da minha ‘casinha’) como seu quartel-general. A partir daí passei a barrar o acesso às minhas intimidades com o tapume que esteja mais a jeito, seja uma toalha ou um lençol.

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Comecei a bulir logo no segundo dia (queriam dar-me folga, mas não senti necessidade); já escrevi umas tretas (que espero saiam em português que não me envergonhe, porque não tenho forma de ver os textos em página e acompanhar os cortes); rio-me diariamente com as peripécias made in África ( hoje a empregada cá do jornal deitou o meu almoço para o lixo porque pensou que estava esquecido no frigorífico, imaginem a minha cara de tacho a imaginar o que teria acontecido ao pitéu) e não deixo de me arrepiar com algumas cenas (ainda há pouco passou por mim um ratinho todo abusado, que, já me inteirei, faz parte de uma ‘família’ aqui do sítio).

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Já fui a alguns restaurantes (tudo cá é um absurdo de caro) e ontem estive na Ilha de Luanda (acesso por carro, ao contrário do Mussulo que implica travessia de barco), onde está um dos circuitos mais concorridos da noite. E por falar em night, nem me atrevo a sair sem escolta masculina porque, pelo pouco que se vê nas ruas (pouco porque aqui raramente se anda a pé), o assédio nesta pátria é muito duro.

No sábado fui a um dos spots mais in para danças (Chill Out) e adorei a parada. Espaço catita, música boa, calor, gingado…. Enfim, não me faltou nada. Fui com o meu amigo tuga que está a bulir a 60 km de Luanda e que vai ser o meu grande companheiro de batida por cá.

Mas como não há party que não dê em aventuras, este fim-de-semana manchei completamente a minha reputação: o meu segurança de prédio ficou a olhar para mim com ‘aqueles olhos’, provavelmente por ser ‘perdida’ a ponto de desfilar com um camone e, depravação das depravações, por deixa-lo dormir lá em casa. Uma escandaleira pegada!

Outro pormenor nada interessante cá do sítio: os copinhos de leite como vocês são presa fácil para os polícias. São recorrentes os casos de infracções inexistentes, inventadas à medida dos bolsos dos senhores da farda (ninguém quer arriscar um problema com as autoridades). Como o meu amigo tem a cor do crime, saí de casa prevenida com o número de um colega que, garantem-me, safa tudo e todos à distância de um telefonema.

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Mais choque, menos choque, tenho resistido leve e solta, sorriso no rosto, havaiana no pé e sempre com o pensamento no retorno de tudo isto. Entre outros mimos, dizem-me que em Fevereiro teremos uma formação em Finanças na Católica cá da banda.


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