terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Gira a bola #3

Não cumpri a tradição dos sucessivos jantares. Perdi as sempre animadas trocas de prendas, não vi plantada uma única árvore de levar por casa e, tragédia, das tragédias, não acompanhei o ano de estreia natalícia da Leonor.

Pela primeira vez longe do núcleo familiar e do meu pouso passional, este ano vivi o Natal como quem explora uma viagem de desencontros pelo desconhecido, com passagem especial pelo culto dos cabazes. Ou melhor: dos mega cabazes, pacotes de géneros criteriosamente seleccionados a partir de promoções de catálogos, e tão despropositados na forma que exigem uma bagageira espaçosa para serem transportados. Tudo com tamanho preceito que não há trabalhador que não deite contas à ceia antes de deitar mãos ao cabaz que vai açambarcar.

Nisto de captar o mais possível de tudo, dou meia-volta ocular pelo mais básico dos cabazes da minha temporária cultura laboral e depressa percebo a empolgação: 15 quilos de batatas, 24 latas de refrigerante (gasosa, em terminologia local), 24 latas de cerveja, quatro garrafas de vinho, uma da espumante, conservas, azeitonas, bolinhos secos, bacalhau etc e tal.

Continuo a minha ronda pelo mundo novo dos cabazes e logo entendo a origem de uma e outra reclamação: há categorias deles onde até cabem plasmas de televisão.

Na expedição pelos excessos que tanto caracterizam esta nação, tempo ainda para me surpreender com outra tradição de época: a do amigo oculto. Presente em cada encontro de Natal e até nas comemorações de formalidade profissional, o acontecimento está para o angolano Natal como as filhós, rabanadas e sonhos estão para o luso Natal. Com a diferença de que em vez de engordarem as medidas, as festas daqui servem-se para engordar egos e status (sim, eu sei que na tuga também há destas).

Juntam-se a tantas e outras nataltrivialidades – onde se incluem ‘estendais’ de brinquedos nos passeios de venda ambulante – as novidades dos pés destapados em pleno avançar de Dezembro, da exposição de pernas, dos casacos renunciados e de tantas e tantas pequenas particularidades que é grande de gigante a minha constatação : neste respirar estreante de novos ares, invade-me uma incompatibilidade natalícia a modos que antropológica.

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