terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Gira a bola #1



Informação de última hora: todas as semanas, no dia em que calhar, postarei as minhas aventuras e desventuras de expatriada. A partir de já, e com reflexos retroactivos.


O peso das primeiras impressões sobrecarrega-me desde Lisboa. Tinha três reservas em meu nome, repetiam-me que de Luanda ninguém se lembrara de regularizar a situação, e, sem mais opções, vi-me obrigada a pagar uma tal de taxa de penalização. África, pensei!

Muitas voltas e um dia depois, com as bagagens para trás e para a frente, voo ao encontro do meu destino, quando, logo no avião, bato de frente com o jeito mwangolé de ser. Além do puto que não se calava por nada, insistindo numa cantoria esganiçada de não sei o quê, sob o descaso completo da mãezinha do ano, deparo-me com as interrogações típicas de um enigma.

Bola lida, Visão no saco, alternada por uma revista cor-de-rosa (que ainda nem folheei) e…cadê o Público? Inspecciono à toa tudo quanto é buraco à minha volta e , meio ensonada, estaciono as vistas sobre o passageiro da esquerda. Observo-o em cada gesto de leitura, ouço o sotaque denunciar-lhe a origem angolana e imagino uma idade compatível com a cabeça grisalha. Naaaa! Volto a inspeccionar tudo quanto é buraco à minha volta e, já resignada, direcciono a dúvida. «Por acaso apanhou o jornal no chão?».

Naaaa! Com a maior das descontracções, o senhor explicou-me que sacou o jornal da arrumação de costas do meu banco. De queixo caído, boca aberta e um sem número de sinais de estupefacção, ainda não sei como consegui articular as ideias: «É que o jornal é meu e ainda não o li». Safa de um linchamento que senti iminente na troca de olhares , lá recuperei o jornal e tratei logo de averbar o retrato da situação ao meu álbum de angolanices. Eta, povão abusado!

Durmo mais um pouco, por mais um pouco questiono a minha resistência às personalidades de nacionalidade angolana e, entre sonhos, o tempo de aterrar apanha-me já descansada. Pé em terra firme, passagem obrigatória pelo controlo fronteiriço e, de repente, ultrapassa-me um novo sinal de inquietação: qual beneficiário único de uma via verde improvisada, um grupo de 10 ‘importantes’ segue livre o caminho de desrespeitar a espera dos outros.

P*** que pariu as vipalhadas, grito em silêncio para o meu interior, ainda impregnado de decoros europeus. Encaixado o devido ajuste, avanço em força com o pensamento centrado nas plastificadas bagagens, e, quase uma hora depois – sofrida entre a agonia de perder três meses de vestes e a desconfiança, semeada por um angolano, de que as bagagens estavam a ser devidamente arrombadas – recupero o conforto na leitura de um cartão com o meu nome. Luanda recebia-me no masculino.

2 comentários:

  1. LOL! Cheira-me que vens daí completamente mudada :)
    Vou ficar à espera de mais novelas angolanas, já vi que enredos não faltam!
    Beijos, amiga!! Com muitas saudadessss!
    Ivana

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  2. Completamente mudada deixaria de ser euzinha! Voltarei enriquecida, disso não tenho dúvidas.
    Bjs engordados por saudades

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